sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Adeus, Scott Johnsonn

Chegamos ao fim. Claro que é só no que toca à minha parte, pois ainda faltam alguns textos e algumas coisitas que dão prova da existência do nosso herói, como a arcária dentária que um dentista de Coimbra ficou de mandar junto com um texto em que descreve uma consulta; a leitura de mão e a análise do baralho de tarot que fizeram dele, fotografia e até impressão digital está para vir. Acredito que não aparecerá uma certidão de óbito e fico muito feliz em ter dado início a essa brincadeirinha que despoletou tanta coisa bonita e engraçada como o texto do próprio Scott contado pela Mariana Bienhachewski.


Mané

Corrigindo a Vida


Há temor maior que a abertura de um livro? A surdez que antecede o espamo. Aquele momento fugidio – e para tantos sem nenhuma importância – em que se dilacera a capa? Existe alguma taquicardia superior ao deflorar açucarado desse rompimento?
Pois bem, eu cresci sentindo essa emoção. Cada página mergulhada me foi mais importante do que beijo de namorada. Por muito tempo, senti-me um estrangeiro de mim mesmo, um foragido do planeta, caminhante de muletas.
Olho hoje para tudo o que se considera mundo e me choco. Agora, agora que tenho pessoas em minha posse, agora que há relações verdadeiramente humanas pulsando dentro das minhas emoções, questiono-me sobre o meu teórico aprisionamento.
As pessoas que passam por mim – ao contrário dos meus esféricos personagens de outrora – são cartões postais de si mesmas. Paisagens magistrais, mentiras fotográficas, sóis em brasa sem luz alguma. Todos com um estarrecedor medo de viver.
Empiricamente, vejo que não há depressão, bipolaridade, ansiedade ou esquizofrenia. A maior patologia de todos é a própria vida. Pavor ao câncer, ódio à pobreza, ojeriza à criminalidade. Medo de matar, medo de morrer, medo da loucura, medo de desvelar a verdade. Medo do adoecer. E é tão devastador esse medo de viver que o medo torna-se invólucro do enfermo. E se morre, literalmente, de tanto se pensar na iminência dos perigos.
Dir-nos-ia o mestre Guimarães Rosa que o viver é muito perigoso. Quantas vezes fui acusado de covarde, pela escolha da literatura! Eu? Eu que naveguei por abismos impossíveis, por angústias algemadas. Eu que não recolhi os pulsos, para não esconder os quelóides do suicídio fracassado. Eu que dormi ao relento, acompanhado de seres inumanos. Fui, inerte, o grande protagonista dos anoiteceres da alma! Eu e os meus autores. Testemunha da única verdade. Porque escrever é ter a nudez tatuada.
Em minha casa não entra ninguém que não tenha sido convidado. Na minha cama só há espaço para volúpias. As mulheres dos meus devaneios têm lábios mais maduros e seios desprovidos de consertos mesquinhos. E as páginas me engravidam de vocabulários e sonhos e sentidos redondos. E, às vezes, eu declamo minha cumplicidade para impregnar minha sala em amarelecidas fumaças. Inebrio-me com o gosto mofado dos anos. E durmo tranquilo porque o amanhã me reserva o inefável.
Sim. Eu só posso ser o farol que se arrisca frente às tempestades porque me nutri em coragens escritas. E saio pelos papéis pulverizando insanidades e encorajando mentecaptos. No entanto, há mais veracidade em mim. Eu, Scott Johnsonn, temerário analfabeto da vida.
Afinal, quem é letrado em viver? Vocês, com suas fobias, suas alergias ao oxigênio? Vocês, mais sujos que os mendigos? Mais vis que as meretrizes? Vocês, atordoados por ressacas morais! Por inúteis amnésias alcoólicas? Com o receio tedioso de soltar o ignóbil que os corrói por dentro?
Vocês, agorafóbicos que são! Ressecados pelo horror à chuva. Invencioneiros sem bússola. Infames pelas próprias castidades. Como se os deuses estivessem preocupados com seus pecados mínimos. Acham mesmo que os deuses explanam a pureza?
Eu cresci com os mitômanos abençoados. Homens e mulheres que corrigiram a vida através de suas inventivas narrações. Delirantes, fracos, derrotados. Imperfeitos. Mas que puderam transmitir esse impalpável fiapo. Que cicatrizaram sua inconsciência ao tecer oraculares linhas em sinceridade. Porque o outro, espelho do avesso, anestesia todas as essências. E é a literatura – de quem lê e de quem aceita ser hospedeiro – é ela a mãe das nossas terras.
Parem! Chega dessa repulsa a mim! Eu, como todos aqueles que des-cobrem os signos dessa humanidade, sou incapaz de dissimular. Transparente como são todas as infâncias. Descrevo minhas mazelas. Rasuro-me. Reviso-me. E sei. Jamais abrigarei o ponto final.

Mariana Bienhachewski

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Mais uma pendente

Uma que dá em duas.
O Hugo tratou de um divórcio, à revelia, a pedido da cliente Maria Smith. Um trabalho como qualquer outro. Mas, triste dele quando ao folhear os escritos do Scott Johnsonn descobriu que aquele escritor era o cidadão Johan Smith e que ele atirara para a rua da amargura. E o pior, meio aqueles escritos havia um em que o escritor dissertava como se fora ele a pedir o divórcio e começava com uma frase lapidar, intraduzível que queria dizer mais ou menos, "Para onde vai o amor que se perde?"
Coitado do Drolhas, o advogado!

Histórias pendentes

O escritor Ondjaki teve dois dedos de prosa com Scott Johnsonn e, só depois que se despediram foi que teve uma leve impressão, que lhe pesou na consciência, de que o outro havia deixado nas entrelinhas da conversa a intenção de se suicidar.
O Ondjaki dificilmente terá o vagar para escrever essa passagem, não fosse ele um dos mais requisitados escritores dos nossos dias, mas esse encontro já foi aproveitado em “O rio, ou de um encontro no Tejo”, pelo professor psicólogo António Gonzales que descobriu Scott Johnsonn no homem à beira do Tejo… Para alívio do escritor angolano: foi aquela oportunidade de desabafo que facilitou o trabalho do professor que conseguiu convencer o estranho a participar de uma aula práctica no ISPA (Instituto de Psicologia Aplicada), na qual foi o protagonista de um psico-drama que, para além de dissuardí-lo de seus intuitos funestos, fez com que se descobrisse de onde vinha a sua compulsividade para a escrita.
Uma ideia para terna história é a da Giazinha (não me recorda o seu nome) que, pelos vistos (já lá vai tanto tempo), também não a porá no papel, e conta de uma andorinha que todos os anos fazia o ninho junto à janela do soturno e obstinado escritor e confundía-o como sendo um dos adereços da sala.
Outro carinho de história pode surgir da imaginada pela senhora Maria João, que muito bem conhece o universo canino, pela paixão e pela convivência, tem seis em casa e uma tatuada no ombro. Trata-se de um cão que o avô do Scott fez presente ao neto e que prefere acompanhar o velho pela boêmia que ficar em casa com o jovem que estava mais para a companhia do gato da casa a roçar o rabo duro nas pernas daquela estátua sentada. Segundo a João, é o próprio cão o narrador. Eu dei ainda a sugestão machadiana de que fosse uma história póstuma: O cão contaria que morreu atropelado na Quinta Avenida, mas que morrera feliz da vida pois, livre.
Muitas outras existem mas ainda estão presas.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Reta final

Como as ideias não escolhem as cabeças e muitas boas estão fermentando em cabecinhas tão atarefadas que não conseguem sair do forno, dou aqui o meu palpite a todos que por uma razão ou outra não as podem passar para o papel: Vamos fazê-las circular. Aposto que tem outras pessoas com o dedo coçando para escrever e sem ideia alguma. Vamos "passar a bola"!
Vou enviar um convite do blog do Scott Johnsonn para algumas pessoas (infelizmente só é possível para cem) pois assim fica mais fácil para postarem.
Vou recolher algumas e distribuir.
Aguardem só mais um pouquinho.